I - As coisas correm mal por cá...
Normalmente não se associa a política a futebol (há, evidentemente, muitas excepções). Costuma-se até olhar para o futebol como uma ilha separada do resto do mundo; certamente que os jogadores de futebol não têm de se preocupar com a austeridade.
Mas a crise afecta toda a gente, incluindo o FCP. A austeridade ainda está para durar pelo menos mais uns anos. Algumas medidas têm impacto directo sobre as contas de um clube de futebol (por exemplo, o aumento do IVA dos bilhetes para os jogos). Há outros efeitos indirectos:
-as pessoas cada vez têm menos rendimentos, e vêem-se obrigadas a cortar nas despesas; quotas de sócio, bilhetes para o futebol, 'merchandising' dos clubes, tudo isso é das primeiras coisas onde se corta
-a carga fiscal aumenta, e isso é menos dinheiro para o clube (apesar da redução recente da contribuição para a Segurança Social, que numa empresa com a estrutura de custos do FCP até deve ter um impacto razoável)
-para os clubes mais pequenos, os apoios do Estado (autarquias/ regiões) cada vez vão ser menores. Isso já resultou em muitos clubes que, de uma forma ou de outra, faliram. Isso é mau para o FCP: significa ainda menos concorrência a nível interno, a "Escociazação" da liga portuguesa.
-as grandes empresas também têm de cortar nos orçamentos, e isso inclui os patrocínios.
-há o risco da elitização dos adeptos - só vai ao estádio quem tem dinheiro, só há bola na TV para quem pagar.
II - ...e isso vai ter impacto na Europa
Pode-se argumentar que o FCP hoje é um clube mais europeu que português - e que a principal fonte de receitas é a estratégia de venda de jogadores.
Mesmo aí a austeridade tem influência. O progressivo aumento dos impostos sobre o trabalho torna mais difícil captar jogadores estrangeiros; para competir com ofertas de clubes em países com menos impostos, o Porto terá de pagar um valor bruto superior.
Mais: na divisão dos dinheiros da Champions, o contributo de cada país para as transmissões televisivas é um dos critérios de distribuição de receitas. Ou seja, com a pobreza das TV nacionais, cada vez menos dinheiro virá daí para os clubes portugueses.
E por muito dinheiro que venha da Champions ou das transferências, o FCP continua a ser um clube de Portugal: um país com uma recessão de (pelo menos) três anos, 16 por cento de desemprego, salários a cair a pique. Isso será inevitavelmente um país com cada vez menos gente nos estádios (aliás, cada vez menos gente tout court) e cada vez menos receitas para os clubes.
O 'handicap' português que o Porto sempre teve vai ser cada vez mais pesado. É verdade que a economia do resto da Europa também não é famosa, mas só os clubes gregos é que têm de enfrentar uma crise comparável.
Os triunfos do Porto na Europa nos últimos 30 anos já eram milagrosos, tendo em conta a desvantagem do país de origem. Temo que nos próximos anos a desvantagem vá ser maior ainda.
Adenda: Não concordo necessariamente com as soluções apresentadas nesta entrevista, mas mesmo assim é uma leitura muito interessante.
Portugal é um país pequeno demais para o FCP. Políticos pequenos, gente pequena, o Futebol Clube do Porto sobressai porque em terra de cegos quem tem olho é rei e quem dois olhos é campeão. Valia bem a pena pensar em largar o campeonato deste país pequeno e partir para uma Euroliga.
ResponderEliminarSaudações portistas,
Álvaro Ferrão