sábado, 19 de maio de 2012

O Jamor é uma fraude que ainda há-de matar (mais) alguém


No domingo há final da Taça. O FCP não é parte interessada (enfim, boa sorte Pedro Emanuel), mas como é participante frequente nesta coisa, esta questão é relevante:

-o estádio do Jamor não tem condições para receber jogos de futebol e é criminoso fazer lá uma final da Taça.


Fui a duas finais da Taça no Jamor. O estádio fica a menos de dez minutos de minha casa. Nunca mais lá hei-de pôr os pés outra vez e recomendo vivamente que não vão lá. Em termos de segurança, o Jamor é comparável ao falecido Vidal Pinheiro.


PORQUE É QUE O JAMOR É TÃO MAU


*O estádio tem uma única saída, estreita, onde as claques se misturam

*Há muito pouco espaço entre a filas de assentos; as escadarias são estreitíssimas

*O controlo de segurança entradas é perfeitamente patético comparado com o de qualquer estádio moderno - dá para entrar lá dentro com uma catana e uma bazuca

*A área circundante ao estádio é larga e impossível de controlar pela polícia. Apesar disso, os acessos rodoviários ao estádio afunilam por estradinhas que resultam em enormes engarrafamentos

*Os "stewards" não conhecem o estádio; como só se realiza ali um jogo por ano, a polícia e os funcionários andam aos papéis

*Isso reflete-se inclusivamente  na venda de bilhetes e na distribuição de adeptos. Na final da Taça de 2006, o meu bilhete, comprado nas Antas, deu acesso à bancada... da claque do Vitória! Eu e mais umas dúzias de portistas tivemos de ser redistribuídos para uma zona especial no meio dos adeptos do Setúbal - tudo feito à bandalheira, porque os stewards estavam evidentemente mal organizados num estádio que não conheciam. Correu tudo bem, os setubalenses são gente pacífica - mas e se a final não fosse Porto-Setúbal?...

*Já agora: o estádio não é coberto e os jogos são de tarde, sob o sol de junho em Lisboa; não há bares nem casas de banho. O Jamor tem as condições de segurança, conforto e organização de um estádio dos anos 50.


Enfim, é daquelas histórias em que se costuma dizer que "qualquer dia morre lá alguém".


O Jamor é o único estádio de Portugal em que uma pessoa foi assassinada nas bancadas.

E dizem, isto podia ter acontecido em qualquer outro estádio, a culpa não é do Jamor - pois, podia ter sido em qualquer lado, mas não foi, foi no Jamor. Há centenas de estádios em Portugal, onde  todos os anos se realizam milhares de jogos, e no entanto o único estádio onde morreu gente calhou ser aquele.


MAS SE O JAMOR É TÃO MAU PORQUE É QUE AINDA FAZEM ALI A FINAL?


Porque só é FESTA DA TAÇA se for no Jamor! Como é que seria se fosse noutro estádio, nem havia jogo! É a tradição! É a tradição, a tradição, a tradição, a tradição, a tradição, a tradição, a tradição, a TRADIÇÃO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! É a FESTA DA TAÇA!!!!!!!!!

Bem, não há argumento mais mentecapto do que dizer "sempre foi assim, portanto tem de continuar a ser sempre assim". O Estado Novo também era uma tradição que durou mais de 40 anos, porque é que vieram aqueles chatos do 25 de abril estragar a tradição?

A referência ao Estado Novo não é por acaso. O Jamor da "tradição" e da "festa", o "estádio nacional", é uma obra de celebração do salazarismo:

"o Estádio Nacional era uma velha aspiração do Estado Novo, que procurava com este novo recinto não só a promoção da prática do desporto, mas também a criação de um espaço para demonstrações públicas inspiradas nos princípios políticos vigentes. "
O conceito e a arquitectura do Jamor são inspirados nos estádios olímpicos de Berlim (construído por Hitler) e de Roma (construído por Mussolini). Sim senhor, rica tradição que estamos a celebrar. E porque não fazer desfiles da mocidade portuguesa antes de começar o jogo?


O VERDADEIRO ARGUMENTO


Para muita gente, ouvir falar em tirar a Taça do Jamor é um argumento do FC Porto - e, se o Pinto da Costa quer alguma coisa, imediatamente geram-se anticorpos. A conversa da "tradição" e da "festa da Taça" vem daí. Como a ideia é portista, a nação desconfia.

Ora, há mérito no argumento  de que a final da Taça não devia ser sempre em Lisboa. Em praticamente todos os países da Europa (Inglaterra é uma excepção - mas já lá vamos) a final da Taça roda por várias cidades.

Mas nem quero ir por aí. Se a única maneira de acabar com a tirania do Jamor é garantir que a Taça fica em Lisboa, então vamos fazer a final no estádio do Belenenses ou no de Alvalade. Ou então façam-na na Luz em todos os anos, um estádio moderno e que até é maior do que o Jamor (embora tenha alguns problemas eléctricos).



INTERLÚDIO: AS COMPARAÇÕES COM WEMBLEY SÃO UM RIDÍCULO, UM EMBARAÇO E UMA IGNORÂNCIA


Wembley em dia de final... do "playoff" da quarta divisão!


Há quem julgue que o Jamor é o "Wembley de Portugal". Não é preciso saber muito sobre o assunto para perceber o disparate que isto é.

Wembley é o maior estádio inglês - cabem lá 90.000 pessoas, não há nenhum que se compare no resto de Inglaterra.

E estes são os jogos que se realizam em Wembley.

-final da Taça de Inglaterra

-meias-finais da Taça de Inglaterra

-TODOS os jogos da selecção de Inglaterra (incluindo os amigáveis)

-final da Taça da Liga de Inglaterra

-playoffs de subida da segunda, terceira e quarta divisões de INglaterra

-jogos amigáveis entre grandes selecções (por exemplo, um Brasil-Portugal)

Estes jogos têm todos lotações esgotadas ou pelo menos assistências de dezenas de milhares de pessoas (sim , até os playoffs da quarta divisão!) . Realizam-se por ano tantos jogos em Wembley como nos estádios de uma equipa da primeira divisão portuguesa. Wembley é de facto a casa do futebol em Inglaterra. Por comparação, eis os jogos que se realizam no Jamor:

-final da Taça.

-final da Taça de futebol feminino 



AS ALTERNATIVAS


1- Fazer a final noutro sítio qualquer

A final da Taça podia ser em muitos sítios. Esta é a competição mais democrática do futebol; seria festa em qualquer lado.

2- Remodelar o Jamor, fazer do estádio a "casa" das selecções.

Sim, porque se há coisa que Portugal devia agora fazer era mesmo gastar dinheiro em estádios.

3- Deixar tudo como está até haver ali outra tragédia

No país do deixa andar e da "tradição", é assim que se faz.

7 comentários:

  1. Inteiramente de acordo! Eu já fui ao Jamor algumas vezes e só de me lembrar dos acessos fico irritado com aquilo! É digno de uma grande capital... de um daqueles países a que se convencionou chamar de terceiro mundo!

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  2. a última vez que lá fui entrei por trás da bancada central... depois de ser revistado pelo polícia de serviço, ter-lhe mostrado que a garrafa de plástico que levava não tinha rolha... sou "mandado" seguir para o meio do mato para chegar ao meu lugar na bancada. é uma bela palhaçada. não deixam entrar garrafas de água com rolha... mas depois podemos ir para o meio das sebes apanhar pedras...
    num país a sério o estádio de oeiras serviria para jogos dos torneios da inatel e pouco mais.

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  3. Muito bom.

    O Jamor é o sonho das mentes pequenas.

    A Taça para ser festa, com os estádios que há em Portugal, teria de ser em sítios diferentes todos os anos. Ponha-se num pote os estádios capazes de receber uma final e no início do ano define-se onde seria a final. Oportunidade para durante a época o local escolhido preparar e festejar condignamente. Mas não, o Jamor, onde nem a selecçao joga, tem de ter esse joguito para dar o tachinhos que lá tem há gente que la anda...

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  4. Este post merecia ser lido e relido por toda a parte...

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  5. Como diria o Gabriel Alves, o estádio é bonito e arejado. Mas a coisa fica-se por aí. Só lá fui uma vez e quase morria esturricado à braseira do sol. (Mais) outro excelente post do nosso Semedo.

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  6. Aquele percurso do árbitro, escada acima, amparado por dois agentes da autoridade, podia ter corrido tão mal.....

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