quinta-feira, 14 de março de 2013

Crónica de um fim anunciado



CRISTINA QUICLER/AFP


Para compreender o que aconteceu ontem, optei por não escrever a quente e assimilar algumas ideias. É uma espécie de "processos" que estou a tentar pôr em prática.

Assim, sendo, esta análise da eliminação do FCP por uma equipa que, apesar de absolutamente banal, nos foi superior na eliminatória, questiona duas ideias fundamentais:


1.      De que jogadores precisávamos ontem e o que eles nos deram?

Para não ser acusado de falar sempre do treinador (já lá iremos, porém), nos dias que passaram entre o jogo com o Estoril e a segunda mão com o Málaga, dei por mim muitas vezes preocupado com o rendimento atual de alguns jogadores e a influência decisiva que isso tem numa fase como esta da época. Destaco os seguintes:

Hélton: espero que seja a última época como titular indiscutível. Parece que estamos sempre na praia, com ele encostado ao poste a tocar violão e a levantar-se para fazer uma defesa de vez em quando. Passa intranquilidade para a equipa e não gosto disso.

Danilo: como o Filipe já o disse aqui, é um jogadorzito. Se é médio e não lateral, ainda é pior, pois revela uma qualidade técnica (recepção, passe, progressão) manifestamente insuficiente para qualquer posição do meio campo. Falha sucessivamente o tempo de entrada na bola, parece sempre desconcentrado e o sentido posicional revela uma gritante falta de cultura táctica. Já passou demasiado tempo de adaptação. O canto que está na origem do segundo golo do Málaga nasce de um lance similar ao do auto-golo que marcou em Braga para a Taça: num caso meteu a bola na própria baliza. Neste, sozinho, cedeu canto. Cada vez mais convencido de que foi um erro de casting.

Alex Sandro: já se afirmou como capaz de fazer esquecer Álvaro Pereira. Porém, sendo brasileiro e não uruguaio, é mais propenso a excessos de craque, exageros de auto-confiança e displicência. Sendo um jogador com características ímpares num lateral (boa capacidade física, apesar de baixo, excelente técnica, capacidade de progressão e atitude para encarar os adversários), noto-o displicente, pachorrento e perdido em alguns momentos do jogo. Mentalidade competitiva: é o que te falta para seres um jogador acima da média.

Lucho: adoro o Lucho. Mas nem quando tinha 27 anos era jogador para fazer 30 jogos completos de seguida como está a fazer este ano. É penoso vê-lo arrastar-se em campo, esforçando-se em dar à equipa a liderança que não tem no banco. Lucho é um dos jogadores mais inteligentes que já vi jogar, em termos de leitura de jogo e escolha das opções a tomar em cada lance, mas não aguenta tudo.

Varela: já muito foi dito e confesso que não percebo a razão desta insconstância. Procura sempre a solução mais difícil, quando é na objetividade e capacidade de decisão que reside a sua mais-valia.

Fernando: desconcentrado, displicente, pouco aguerrido. Com a cabeça noutro lado, de novo?

Moutinho: se estava lesionado, porquê insistir? Para agravar e ficar de fora mais um mês? Precisávamos do melhor Moutinho nesta fase, mas - não por culpa sua - tivémos um Moutinho diminuído, a jogar a medo, sem arriscar por défice físico.

James: podias ter jogado o jogo todo, dizes? Para resolveres sozinho? É certo que vem de uma lesão, que teve uma recaída por ter sido utilizado antes do tempo, mas tem mostrado pouco. Muito pouco.


2.       Qual era o plano que o FCP tinha para passar esta eliminatória?

Vi o jogo com o Zero e perguntámo-nos durante toda a primeira parte: será que a equipa treinou para este jogo? Qual a abordagem? Será que VP previu os vários momentos e incidências do jogo?

Era sabido que o Málaga tinha de atacar, tinha de marcar e que um golo do FCP retiraria ao adversário a força anímica para procurar a "remontada". Assim sendo, sem surpresa, o Málaga entrou balanceado ao ataque, deixando muito espaço para trás - o FCP entrou bem no jogo, fazendo uso dos tais "processos" de posse de bola, mas absolutamente incapaz de ser objectivo na transição ofensiva, de modo a explorar esse espaço disponível e procurar o golo. Cada vez que recuperávamos a bola, invariavelmente a equipa engasgava-se na saída para o ataque. Vejam lá que demos por nós a recordar com saudade o FCP de Jesualdo, equipa que era mestre na transição ofensiva...

Não treinaram isto durante a semana? Que Fernando recupera a bola, mete em Moutinho, que procura Lucho, com Jackson a criar o espaço na frente e Varela a criar os desequilíbrios? É tão difícil assim treinar isso durante dois, três dias?

Isto para não falar do treino defensivo, que tem sido um dos esteios desta equipa: era assim tão difícil prever que Isco tentaria fazer o que fez no primeiro golo? Alguém contou quantos segundos teve para pensar o que fazer com a bola? Até tempo de simular sem adversário teve, antes de chutar!

E a expulsão de Defour? Foi uma estupidez do belga? Foi, parou-lhe o cérebro. Mas parece-me uma atitude de um jogador absolutamente perdido em campo, um jogador para quem o tal ADN, os processos, a identidade não passam de verborreia do treinador nas conferências de imprensa. Não há identidade, nem processos se os jogadores, cada um individualmente e como colectivo, não souberem exactamente o que estão a fazer em campo. E ontem, nenhum sabia, com a excepção de Mangala e Otamendi, talvez.

E depois da expulsão, como se manifestou a preparação táctica do jogo feita durante a semana? Mais um central; deslocando Mangala para a esquerda e fazendo subir Alex Sandro. Então mas o médio não é o Danilo? E foi com três centrais em campo que sofremos o 2-0, de cabeça, na sequência de um canto.

E depois do 2-0, situação que seguramente o técnico previu? Sai Alex Sandro, perdido nos processos novos a meio campo, e entra Atsu, que fez mais em duas corridas do que Varela nos longos minutos que esteve em campo.

E Moutinho lesionado a jogar de início? Para sair ao intervalo, queimando uma substituição quando Defour já tinha amarelo e se previa uma segunda parte de grande desgaste? Eu e o Zero, ao ouvir a flash interview do futuro ex-treinador do FCP de VP no final, apostámos que nos primeiros 30 segundos ele falaria da arbitragem e como isso condicionou a exibição da equipa. Confirmou-se.

Uma equipa de processos, de identidade, sabe jogar com 10, condicionada por amarelos ou não.

Nos últimos minutos, restou-nos esperar pela pontinha de sorte, pelo golpe emocional, pelo pobre do Jackson contra 5 ou defesas, por um rasgo de James...mas isso não acontece sempre, Vítor. E saímos justamente de uma competição onde estes jogadores ainda tinham algo para dar e perante uma equipa que ainda agora deve estar a pensar como foi tão simples uma segunda mão de uma eliminatória dos 1/8 final da Champions.

Este jogo vai deixar marcas para o resto da época. Eu, pessoalmente, já penso na próxima. Sejamos honestos: ninguém acredita muito nisto, que está preso por arames. O maior desafio do clube agora é voltar a saber encontrar gente de qualidade, competência. Com identidade a sério. 

11 comentários:

  1. Hélton "passa intranquilidade para a equipa"?

    Lucho: temos visto o mesmo jogador? Ou referes-te só ao jogo de ontem? Se for este o caso, concordo que não esteve bem.

    Danilo: tens noção que não se faz um jogador de futebol num ano, certo?

    "Não treinaram isto durante a semana? Que Fernando recupera a bola, mete em Moutinho, que procura Lucho, com Jackson a criar o espaço na frente e Varela a criar os desequilíbrios? É tão difícil assim treinar isso durante dois, três dias?" Tens noção de que:
    1. Não chegava treinar isto durante uma semana. 2. O sistema de jogo vem sendo treinado há mais de um ano.

    Portanto, se saiu tudo mal ontem, a culpa é do treinador?

    Defour: "um jogador absolutamente perdido em campo"? Vi o jogo errado, só pode.

    "Mais um central; deslocando Mangala para a esquerda e fazendo subir Alex Sandro. Então mas o médio não é o Danilo?" Ok, aqui desisti. Com todo o respeito, não vale a pena.

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  2. Meu caro Vítor Hugo,

    a liberdade de opinião e de análise é apanágio deste Café. E gostamos muito saber a opinião e observação de quem o frequenta. Com todo o respeito, sempre

    Hélton: se não passa intranquilidade à equipa, pelo menos passa aos adeptos. Dois exemplos: um lance de Isco em que ele tem "a situação controlada" junto à linha de fundo e apenas por milagre a bola não entrou, o golo anulado, que foi um daqueles momentos Stamford bridge ou Paris...

    Lucho está em défice físico há imensos jogos, Sporting, Estoril e o de ontem foram apenas aqueles onde isso foi mais visível..sendo o jogador incrível que é, vai disfarçando o mais que pode.

    Danilo: um jogador de 18 milhões de euros não devia demorar nem um mês a afirmar-se. Digo eu. É mais lateral o Melgarejo em meia época do que Danilo em ano e meio.

    O sistema de jogo: pois, esse é o ponto principal - o sistema de jogo é parte do problema e não da solução. É previsível, lento e, acima de tudo, com pouca agressividade e acutilância. O jogo de ontem exigia treino específico de transições ofensivas (Jackson abandonado no meio de 4 defesas), exigia rotinas defensivas que não tivemos (os dois golos não se podem sofrer a este nível). O que explica a desorientação a partir dos 35 minutos? O golo do Isco nem nos juvenis, quanto mais nos 1/8 final da Champions...

    Defour ontem foi o quê? Extremo esquerdo? Médio interior? Posição 8? Acho que nem VP sabe, pois é mais importante a arbitragem como desculpa...

    O Alex Sandro foi tão boa aposta na frente que saiu minutos depois....e o Mangala na esquerda é um desperdício de agressividade e postura no centro de que precisávamos. A entrar Maicon, seria para a direita, subindo Danilo para o meio.

    Mas se não vale a pena, não partilhes connosco a tua análise do jogo. Se o FCP fez um belo jogo ontem, se, apesar de ter sido eliminado da Taça, da Champions, estar em segundo lugar no campeonato e em risco de salvar a época na secretaria com a Taça da Liga, tens razão, não vale mesmo a pena. Que continue o treinador, que não tem culpa nenhuma.

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  3. Lá está, eu também não acho que o Helton passe intranquilidade à equipa. Aliás, dificilmente arranjaríamos um guarda-redes a jogar tão bem com os pés, o que é essencial para o nosso estilo de jogo.

    O que mais me enervou no Helton ontem, foram as bolas despachadas para a frente. Isso sim, fora do normal e que ele repetiu muitas vezes e entregamos a bola sem necessidade.

    Danilo é... muito limitado. Dificilmente melhorará muito no que tem a melhorar. Veio rotulado como médio, mas ele não percebe o que o jogo lhe pede. Alex Sandro, em comparação, é muito melhor nesse aspecto e como é melhor, mais facilmente se adapta a outras posições, além de que comparar os dois ofensivamente nem sequer é justo.

    O sistema de jogo do Porto é pouco agressivo? Os jogadores estão sempre perdidos em campo? Devemos ver jogos diferentes...

    Lucho está em défice físico há imensos jogos?! Um dos jogadores que mais se entrega ao jogo...

    Achar que se treina a transição ofensiva durante uma semana e que isso era a grande chave é... sem comentários.

    http://www.diariodeumdragao.pt/2013/03/malaga-2-0-fc-porto-o-fim-do-sonho.html

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  4. Caro Diário,

    Antes de mais, deixa-me só estabelecer uma diferença que nos separa: eu não considero que as opiniões dos outros adeptos sejam "parvoíces do género" quando não coincidem com a minha. São opiniões - apenas isso - baseadas no modo que cada um de nós tem de viver o clube, a exigência e a bitola auge consideramos satisfatórias, e o gosto pessoal que temos num jogador em detrimento de outro, etc. Aqui no Café, muito frequentemente divergimos nas nossas opiniões, mas o facto salutar é mesmo esse: a pluralidade, e não o unanimismo, enriquecem e fortalecem o clube.

    Sobre o comment, eu também vi o Lucho correr o jogo todo. E tenho-o visto sempre como um dos que tem mais entrega e que nunca sabe jogar mal. Agora, é minha opinião que a sucessão absurda de jogos consecutivos que tem feito retirou-lhe frescura física que poderia ter sido importante nesta fase da época. E sem essa frescura física, acho que não tem o mesmo discernimento nem influência na equipa.

    Sobre o sistema de jogo, eu não gosto de sofrer golos como o que sofremos com a olhanense e rio ave em casa, ou os dois de ontem. Acho a equipa macia, expectante em momentos decisivos do jogo e, em minha opinião, isso não é jogar à Porto.

    Sobre as transições ofensivas, como é natural, não penso que se treinem numa semana ou em três dias. Mas uma equipa com ADN, processos, identidade, deve ser capaz de desenhar uma abordagem específica a cada jogo que lhe permita explorar as vulnerabilidades do próprio jogo que o adversário tinha de fazer. Por exemplo, o que vimos o FCP fazer na Luz: conhecia o adversário, posicionou-se, atacou com firmeza, identidade, uma ideia se jogo. Mas alguém fica satisfeito quando a nossa produção ofensiva é o jackson completamente sozinho na frente, à espera de um rasgo de inspiração, de uma bola perdida?

    Não acho que isso seria a grande chave, mas seria bom termos atacado um pouco mais e melhor no início do jogo e fazer um golo que acabasse com a eliminatória.

    Mas se achamos que o FCP está a fazer uma grande época e que estes jogos são excepções (que custam eliminatórias, prestígio e dinheiro), continuemos. Podemos ficar assim e ir buscar o Peseiro para adjunto.

    Continuaremos é a ler coisas destas: http://www.maisfutebol.iol.pt/liga-dos-campeoes/fc-porto-porto-vitor-pereira-liga-dos-campeoes-uefa/1429268-1491.html

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  5. em grande BP. Subscrevo quase tudo. Ia escrever mas está tudo dito. Detalhes sobre este ou aquele jogador pouco importam sobre a questão de fundo que pairou sobre o jogo de ontem. Há ainda campeonato para jogar. Vamos ver.

    ps - as reacções são sempre bem vindas, mas aborrece-me que todas elas sejam sempre num tom de "arrasar" o que foi escrito, como se tudo fosse preto e branco. O clima no futebol está a passar um momento muito feio a meu ver, como se a rivalidade já de si podre entre Benfica e Porto estivesse a passar para adeptos do mesmo clube. é algo que vejo a acontecer em todos os clubes. Deixou-se mesmo de falar de futebol para se falar sobre o "falar do futebol". E mais, parece que anda-se nas teimosias, no "eu bem disse" quando são esses os primeiros a ter teimosias voláteis e o "eu bem disse" é apenas acertado porque dizem tudo e o seu contrário. Respeitar uma opinião é cada vez mais raro e ver alguém a evoluir nas opiniões ainda mais.

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  6. Vocês estão todos em grande forma! Não vi o jogo ontem (estranhamente os alemães preferiram o Bayern-Arsenal) e tenho que vos dizer: foi no "nosso" Café que li as melhores análises; bem escritas e fundamentadas.
    Consensuais?
    Não creio que seja esse o objectivo...

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  7. BP, então todas as ideias têm o mesmo valor? Isso faz sentido? Não, porque há ideias que são melhores que outras, há umas que são parvas, há umas que são mais ou menos, há outras que são melhores, etc. E são as ideias que eu discuto, não as pessoas.

    Não tenho a pretensão de achar que tudo o que escrevo seja bom ou faça sentido para os outros, muito menos de passar a ideia de que falo para além de mim, ou de denegrir o trabalho dos outros só porque não gosto da pessoa.

    E para mim, chegar-se a um extremo em que se descaracteriza aquilo que realmente se passou só porque não gostamos do resultado, não faz sentido.

    Alguma fez disse que era uma excelente época? Não, não disse. Quem está aqui em extremos não sou eu. Gosto de como a equipa joga, acho que podia ter ido mais longe.

    Óbvio que não gosto das más exibições, dos maus momentos, mas não me aproveito deles.

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. saudações a todos,

    uma coisa é certa, Helton tem demasiados erros em jgs decisivos na europa, nem é preciso desfilar o rol... esperemos q Danilo melhore mt, bem é preciso, de qq maneira subir o Alex ou o Danilo seria mais ou menos igual aquando da inqualificável expulsão do Defour, lembro q levou o 1º amarelo por evidente falta de disponibilidade de dar o corpo ao manifesto, preferiu meter o pé e com isso e respectivo castigo disciplinar...ekipa mt mal preparada e sem ideias, algo q se vem a manifestar tb no campeonato.
    só com mt apoio é que poderemos aspirar a ganhar o campeonato, temas como o treinador, danilo e outros só mesmo no final da época, até lá todo o apoio é pouco, numa época com mt falta de atitude á PORTO.

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  10. Mais um desaire do Porto. Não é difícil prever que o café vai animar. A "pena grossa" dos cativos de serviço vai trabalhar...

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  11. Oliveiros, façamos o seguinte: para variar um pouco, dá-nos a tua visão sobre a fulgurante exibição de hoje e a perspectiva para o resto da época e o Café compromete-se a publicá-la. Assim sempre refrescamos ideias e compreenderemos aquilo que nos está a passar ao lado...

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